• Defesa de Alexandre Ramagem

O segundo réu a ter sua defesa apresentada foi Alexandre Ramagem, ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e atual deputado federal pelo PL-RJ.

De acordo com a PGR, Ramagem teria usado a estrutura da Abin em favor dos planos golpista

O advogado Paulo Renato Cintra disse que seu cliente não estava mais no governo quando o suposto núcleo crucial da trama golpista teria atuado

Ele ressaltou que, segundo a denúncia da PGR, a organização criminosa “se perpetuou até o 8 de janeiro” – ou seja, após seu cliente assumir o mandato de deputado.

Ao longo de sua fala, Cintra também questionou o uso de anotações feitas por Ramagem como prova no processo. De acordo com o advogado, os arquivos encontrados pela PF, que continham argumentos contra o sistema eleitoral, eram apenas anotações, algo como uma “diário” do réu.

A defesa disse ainda que “não há elementos nos autos” que demonstrem que esses documentos foram entregues a Bolsonaro.

Cintra afirmou ainda que houve, nas alegações finais do MPF, um equívoco muito grave em relação a Ramagem – segundo ele, causado pela falta de tempo para uma análise mais aprofundada.

O erro, diz, teria relação com o uso do software israelense de monitoramento First Mile na gestão Ramagem.

Segundo Cintra, um registro de acesso ao software teria sido confundido com outro registro, de acesso às dependências físicas da Abin em Brasília, citado pela PF em seu relatório.

O advogado também pediu para que o STF deixe de fora do julgamento o inquérito que investiga o uso do software “em atenção ao contraditório, ao devido processo legal e à defesa pugna”.

  • Defesa de Almir Garnier

O advogado Demóstenes Torres, ex-senador da República, foi o responsável pela defesa do almirante Almir Garnier, ex-comandante da Marinha.

Garnier foi o único comandante das Forças Armadas a concordar com o plano golpista, segundo a acusação da PGR.

Demóstenes Torres usou quase 20 minutos para apresentar sua trajetória e cumprimentar os ministros.

“É possível gostar do ministro Alexandre de Moraes, e, ao mesmo tempo, do Bolsonaro? Sim. Sou eu”, disse ele.

Torres teve seu mandato cassado em 2012 devido a investigações relacionadas ao empresário Carlinhos Cachoeira, acusado de ter ligações com o jogo do bicho.

Já sobre Garnier, Torres pediu a rescisão da delação de Mauro Cid, e não a anulação da mesma.

Segundo ele, isso implicaria em apontar quais provas seriam “independentes”, ou seja, não teriam sido apontadas pela delação de Mauro Cid, para que permanecessem no processo. Ele pediu também que o processo tenha uma “individualização”, tendo que se deixar claro que cada réu fez.

Sem apresentar provas ou qualquer argumento, Demóstenes Torres, advogado do almirante Garnier, diz que o resultado do julgamento, independente de qual seja, “não vai permanecer. A história vem aí”.

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Legenda do vídeo,Demóstenes Torres: “É possível gostar de Bolsonaro e Alexandre de Moraes ao mesmo tempo? Sim, sou eu”
  • Defesa de Anderson Torres

Em sua sustentação, o advogado Eumar Roberto Novacki, defensor de Anderson Torres, argumenta que a acusação contra seu cliente é “ponto fora da curva.”

“Infelizmente, a PF e o MP não estavam interessados na verdade”, disse Novacki.

O advogado aponta duas supostas falhas na acusação da PGR a respeito de Anderson Torres, que foi ministro da Justiça do governo Bolsonaro e era secretário de Segurança do Distrito Federal quando houve a invasão da sede dos Três Poderes, em Brasília. No dia 8 de janeiro, Torres estava nos EUA.

Segundo Novacki, um email da companhia aérea Gol provaria que a passagem foi emitida em novembro de 2022, portanto num período em que não haveria nenhuma menção aos ataques do 8 de janeiro.

O advogado também leu uma declaração do governador do DF, Ibaneis Rocha, que disse ter conhecimento da viagem de Torres aos EUA – o MP argumenta que Torres viajou sem o conhecimento do governador.

O representante da PGR pediu a palavra e disse que um comunicado enviado pela Gol não confirmou a reserva do bilhete de Anderson Torres.

O próprio Novacki admitiu que “não conferiu a veracidade” do comunicado da Gol à PGR.

Segundo a PF, foi encontrada na casa de Torres uma minuta que sugeria a decretação de estado de Defesa para intervenção após a derrota de Bolsonaro nas eleições. A defesa sempre argumentou que a “minuta do golpe” era um documento sem importância e que Torres desconhecia a origem dele.

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Legenda do vídeo,Cármen Lúcia questiona advogado de Alexandre Ramagem durante julgamento no STF
  • As alegações das defesas que ainda não falaram no julgamento

As defesas do general Augusto Heleno, do ex-presidente Jair Bolsonaro, do general Paulo Sergio Nogueira e do general Walter Braga Netto falarão nesta quarta-feira.

Antes mesmo da data oficial do julgamento ter sido definida, todos os réus entregaram ao STF suas alegações finais.

A equipe de advogados de Jair Bolsonaro, liderada pelos criminalistas Celso Vilardi, Paulo Cunha Bueno e Daniel Tesser, chamou em sua defesa a acusação feita pela PGR de “absurda” e “golpe imaginado”.

Os defensores insistiram na falta de provas que pudessem colocar o ex-presidente inequivocamente no centro da trama golpista e pediram a anulação da delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid, classificando-o como um “delator sem credibilidade”.

Argumentos semelhantes foram usados nas alegações finais dos demais réus. Os advogados do general da reserva do Exército Walter Braga Netto, por exemplo, também atacaram a delação de Cid, afirmando que o ex-ajudante de ordens foi “obrigado a mentir”.

O general da reserva do Exército Augusto Heleno, ex-ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), afirmou em suas alegações finais que há falta de provas sobre o seu envolvimento, afirmando ainda ser “leviana” qualquer associação com a organização dos atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023.

Os advogados do general Paulo Sergio Nogueira, que também foi ministro da Defesa de Bolsonaro, pediram a absolvição do seu cliente e afirmaram que o militar, na verdade, atuou “ativamente” contra o golpe de Estado e era contrário a adoção de qualquer medida de exceção.

Quem são os réus?

Os oito réus que estão sendo julgados na ação penal 2668 a partir desta terça-feira fazem parte do chamado “núcleo crucial” da suposta organização criminosa que, segundo a acusação, teria tentado subverter o resultado das eleições de 2022.

Composto por Bolsonaro e sete aliados próximos, os integrantes do núcleo teriam sido, segundo a Procuradoria-Geral da República (PGR), os principais articuladores e decisores da tentativa de golpe de Estado.

Quais são as acusações?

Em março deste ano, os cinco magistrados que representam a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) aceitaram as denúncias feitas contra Bolsonaro e os demais membros do “núcleo central” pela PGR.

  • Organização criminosa armada;
  • Tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito;
  • Golpe de Estado;
  • Dano qualificado pela violência e grave ameça contra o patrimônio da União, e com considerável prejuízo para a vítima;
  • Deterioração de patrimônio tombado.

A única exceção é Alexandre Ramagem, que com base no argumento de imunidade parlamentar, ele obteve de seus pares, em votação na Câmara, a suspensão do processo em relação aos crimes supostamente cometidos após a diplomação.

Ele responde apenas por golpe de Estado, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito e organização criminosa armada.

Cena de manifestantes durante ataques de 8 de janeiro de 2023

Crédito,Getty Images

Legenda da foto,Além de tratar do suposto envolvimento de Jair Bolsonaro e seus aliados com a tentativa de golpe, a denúncia aceita pelo STF também conecta os réus aos ataques de 8 de janeiro de 2023

O crime de formação de organização criminosa armada é previsto pela Lei nº 12.850 de 2013. A pena estipulada para o indivíduo que integra, financia ou promove uma organização criminosa é de reclusão, de 3 a 8 anos, e multa, sem prejuízo das penas correspondentes às demais infrações penais praticadas.

No caso de Jair Bolsonaro, a PGR destacou em sua denúncia as condições previstas nos parágrafos 2º, 3º e 4º do artigo 2º, que preveem agravamento da pena se na atuação da organização criminosa houver emprego de arma de fogo e se o indivíduo exercer função de comando na organização.

Na denúncia aceita pelo STF, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, apontou a existência de “uma trama conspiratória armada e executada contra as instituições democráticas”. Também faria parte do plano, segundo as acusações, o uso de armas bélicas contra o ministro Alexandre de Moraes, do STF.

O assassinato do magistrado fazia parte do chamado plano “Punhal Verde Amarelo”, que também teria por objetivo assassinar Lula e o vice eleito Geraldo Alckmin.

Já os crimes de abolição violenta do Estado de Direito e golpe de Estado estão previstos no artigo 359 do Código Penal. Eles foram incluídos pela lei de crimes contra a democracia, de número 14.197, sancionada pelo próprio ex-presidente Jair Bolsonaro em 2021.

O texto prevê pena de 4 a 8 anos de reclusão para quem tentar, com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado Democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais.

Também estipula de 4 a 12 anos de prisão para a tentativa de golpe de Estado por meio de violência ou grave ameaça.

Jair Bolsonaro cumprimenta Walter Souza Braga Netto em 25 de agosto de 2022.

Crédito,AFP via Getty Images

Legenda da foto,Jair Bolsonaro e Walter Souza Braga Netto: general da reserva do Exército é um dos aliados do ex-presidente que também serão julgados

Além de tratar do suposto envolvimento de Jair Bolsonaro e seus aliados com a tentativa de golpe, a denúncia aceita pelo STF também conecta os réus aos ataques de 8 de janeiro de 2023 contra as sedes dos Três Poderes da República e os acusa de crimes de dano contra o patrimônio da União e deterioração de patrimônio tombado.

Na ocasião, milhares de apoiadores radicais do ex-presidente, insatisfeitos com a eleição e posse do presidente Lula, invadiram e depredaram o Palácio do Planalto, o Congresso e o Supremo Tribunal Federal (STF). De acordo com a denúncia, a violência cometida teria gerado prejuízos estimados em mais de R$ 20 milhões.

Segundo o procurador-geral da República, Paulo Gonet Branco, o episódio foi fomentado e facilitado pela suposta organização criminosa da qual Bolsonaro faria parte.

Quem são os ministros que votarão?

A ação penal contra o ex-presidente Jair Bolsonaro e os outros 7 acusados será julgada pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal. O colegiado vai decidir se os réus devem ser condenados ou absolvidos.

  • Alexandre de Moraes
  • Flávio Dino
  • Luiz Fux
  • Cármen Lúcia
  • Cristiano Zanin

Moraes abre a votação por ser o relator do caso, seguido pelos ministros na ordem de entrada no STF até chegar ao que está há mais tempo na Corte. Zanin, mesmo não sendo o mais antigo, vota por último por presidir o colegiado.

Como será o julgamento?

O STF distribuiu as sessões do julgamento em cinco datas: 2, 3, 9, 10 e 12 de setembro.

A primeira sessão, nesta terça, começou com a leitura do relatório de Alexandre de Moraes.

O procurador-geral da República, Paulo Gonet, falou na sequência e terá até duas horas para expor sobre a acusação.

Na sequência entraram as defesas, que apresentarão suas sustentações orais por até uma hora para cada réu.

Os advogados de Mauro Cid foram os primeiros a falar, por conta do acordo de delação premiada firmado pelo ex-ajudante de ordens. As demais defesas se apresentação em ordem alfabética.

Finalizadas as manifestações, chega o momento dos votos. O primeiro a ser lido é o de Moraes, relator do caso, que deve se manifestar pela condenação ou absolvição dos réus.

Na sequência, é a vez dos outros ministros, ficando por último o presidente da Turma, Cristiano Zanin.

A decisão se dá pela maioria. Caso haja condenação, Moraes fará uma proposta de fixação das penas, que será votada pelos demais ministros.

Jair Bolsonaro depõe perante o juiz Alexandre de Moraes no STF em 10 de junho de 2025

Crédito,AFP via Getty Images

Legenda da foto,Jair Bolsonaro depõe perante o juiz Alexandre de Moraes no STF em 10 de junho de 2025

Quando sai o resultado?

A leitura dos votos — e, portanto, a decisão final sobre condenação ou absolvição dos réus — é a última etapa do julgamento e deve ficar para os últimos dias de sessões.

Há uma especulação sobre se o ministro Luiz Fux, o terceiro a votar, poderia apresentar um pedido de vista (ou seja, mais tempo para análise do caso), mas as avaliações mais recentes são de que este não seria o cenário mais provável.

A decisão se dá pela maioria. Caso haja condenação, Moraes fará uma proposta de fixação das penas, que será então votada pelos demais ministros.

Há possibilidade, contudo, de que o julgamento não se encerre na data limite estipulada pelo Supremo, de 12 de setembro.

Se o ex-presidente for condenado, mas não por unanimidade, votos divergentes a seu favor poderiam abrir espaço para que sua defesa tentasse recorrer a recursos como os embargos infringentes, que poderiam prolongar a duração do processo.

A defesa de Bolsonaro poderia tentar usar esse caminho, por exemplo, para levar o caso para o plenário do Supremo.

Como e quando assistir?

Você pode assistir ao julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro e dos demais réus no site da BBC News Brasil ou no canal da BBC News Brasil no Youtube, a partir de terça-feira (2/9).

O conteúdo será transmitido pelos canais do Supremo Tribunal Federal.

As inscrições para acompanhar o julgamento presencialmente, em Brasília, já foram encerradas. O STF recebeu mais de 3,3 mil inscrições de pessoas interessadas e disponibilizou 150 lugares.

As sessões de julgamento de Bolsonaro e de mais sete réus no processo criminal por suposta tentativa de golpe de Estado estão marcadas para os seguintes horários:

  • 2/9, terça-feira (9h-19h)
  • 3/9, quarta-feira (9h-12h)
  • 9/9, terça-feira (9h-19h)
  • 10/9, quarta-feira (9h-12h)
  • 12/9, sexta-feira (9h-19h)

Por BBC